Sempre gostei de planear tudo o que faço, não gosto de imprevistos e gosto de até de os prever.
Apesar de ter lido imenso sobre o caminho, debrucei-me mais sobre os testemunhos de inúmeros de peregrinos, os seus pensamentos, medos e as suas vivências e aprendizagens.
Quando escrevi estas linhas, ainda não tinha decidido a data certa partir, mas tinha a certeza que o pensamento e a alma já estavam no caminho. O Caminho não começa com o primeiro passo, começa bem antes, quando no nosso intimo tomamos a decisão de partir. É a partir daí que a nossa alma se inquieta ainda mais e tem uma ânsia enorme de se fazer ao caminho. Dou por mim a caminhar pelos intentos bosques galegos, a imaginar como será atravessar a Serra da Labruja, mas curiosamente nunca imagino a chegada.
Tinha apenas decidido que iria caminhar pelo Caminho Central Português, com saída da Sé do Porto e que esta mesma saída iria acontecer num espaço de dias, talvez 3 ou 4.
Por esta altura os pensamentos são como os caminhos...Todos vão dar a Santiago. Por rotas pré-estabelecidas, muito ou pouco frequentadas, todos queremos lá chegar. Mas como já o referi, não penso na chegada. Não é o destino que mais importa, é a jornada em si...é o Caminho!
Somos aos milhares os peregrinos de Santiago, percorrendo diversas rotas para lá chegar e, mesmo percorrendo a mesma rota, fazemos todos um caminho diferente...o nosso próprio caminho. O Meu Caminho!
É difícil dominar a ansiedade quando falta tão pouco (escrevo estas linhas a 27 de Fevereiro e saí para o Caminho a 2 de Março) para incorporar a mochila e calçar as botas.
O corpo não está preparado...acho que nunca estará...mas vai ter que se habituar. A mente já está no Caminho há muito tempo...meses talvez! Está preparada para absorver tudo o que haverá para absorver, para se transformar, se adaptar e, o mais importante encerar ciclos passados que têm obrigatoriamente que ser encerrados. Há dúvidas e medos que têm que ser deixados no passado, que têm que ser eliminados para que possa perspectivar um futuro diferente.
Escrevo estas linhas junto ao mar, no meu local favorito e onde procuro sempre um reconexão com o meu EU mais profundo. É o meu confessionário privado!
Como sempre os meus olhos recaem sobre o azul profundo do mar, miram o horizonte à procura de algo que não aparece, tem sido sempre esta a rotina nos últimos meses. Ao mesmo tempo que olho o mar e escrevo, a mente está de botas calçadas e procura já a mudança necessária e urgente.
O dia da saída parece-me ainda longínquo, distante...tenho ainda um jantar com os meus filhos no dia anterior à saída e estaria longe de imaginar que seria a última vez que os iria abraçar e beijar durante uns meses...Maldito Coronavirus!
O meu maior medo neste momento nem se quer é o do desconhecido, da dureza física ou mental que irei ter pela frente. É apenas o medo de ficar viciado no Caminho...